Janine Ribeiro - Por uma universidade socialmente relevante

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            Se uma universidade europeia ou norte-americana pode dar-se ao luxo de exibir, como principal distintivo, a pertinência científica – já que as ações sociais e as iniciativas de inovação tecnológica são assumidas pela forte e atuante sociedade civil ali presente –, a universidade brasileira precisa demonstrar, além da qualidade acadêmico-científica e sem de forma alguma renunciar a ela, relevância social. Justamente pela fragilidade da sociedade civil, no Brasil, a universidade tem o dever de ser culturalmente engajada, comprometida com a solução dos problemas da sociedade, com a superação da pobreza crônica, com o fim do analfabetismo, com a geração de alternativas econômicas. Cumprir a universidade parte da tarefa do estado e da sociedade civil não é uma questão de opção ideológica ou de voluntarismo: é uma imposição de sua própria historicidade.

            Relevância social, em outros termos, significa igualmente não abdicar, a instituição universitária, de sua função pública primordial de espaço de preservação e renovação dos valores democráticos e republicanos; de arena do pensamento crítico e inquieto; de centro da vida intelectual que sustenta uma relação reflexiva e ativa com o mundo circundante. Isto porque, ainda que necessite, nos dias atuais, responder à demanda por pesquisas aplicadas ao desenvolvimento de processos e produtos requeridos pelos setores produtivos mais dinâmicos da sociedade, não pode a universidade simplesmente sucumbir à lógica do mercado e silenciar diante das injustiças e desigualdades engendradas pela lógica da acumulação a qualquer preço.

            A universidade, por não ser empresa, rejeita o papel de máquina de produtividade econômica e de competitividade. Não pode se engarrafar nas ruas do mercado. Pois nada substitui seu potencial crítico; sua autonomia de pensamento; sua capacidade de pronunciamento, em tom argumentativo, para a comunidade mais ampla; seu poder de disseminação da reflexividade; sua vocação de centro de criação, questionamento e crítica do mundo físico e social (e de si mesma). Nesse sentido, o conhecimento acumulado em seus ciclos de estudos, em seus laboratórios e grupos de pesquisa, por meio de programas de extensão e outras ações abertas à sociedade, também precisa tornar-se patrimônio de todos, à disposição das comunidades e grupos locais, sobretudo das camadas sociais mais pobres, as quais, de outra forma, jamais teriam acesso a tais recursos.

 

Ribeiro, Renato Janine. Por uma universidade socialmente relevante. Atos de pesquisa em educação – PPGE/ME FURB ISSN 1809– 0354 v. 4, nº 3, p. 292-302, set./dez. 2009.